Monday, September 04, 2006




CAP I
Liberdade
3 - Morte
Durante sete dias e sete noites os demónios torturaram-me, rasgaram-me, devoraram-me e reconstruiram-me. De dia fui queimado, à noite decomposto.
Quando voltei a Morte salutou-me no seguinte modo:
"Bem vindo a casa ó Dragão de sete chifres!"
E, vendo-me exausto na nova luz, colocou o seu braço de podridão à volta da minha cintura. Valsou, valsou comigo. As luas passaram, enquanto valsamos; o tempo voltou atrás rodopiando e enrolando-se nas asas deste dragão, de um fio nocturno de orvalho que se estatela no solo. O Reino dos Céus era uma promessa, pura negridão, crua verdade, solidão.
Os espiritos dos abismos valsaram conosco a valsa da morte, e nos nossos semblantes desenhava-se um sorriso triunfal, ébrio de caos, de um cansço incansável...
Então sonhamos que as estrelas explodiam como recordações do passado, como vivências eternas; como premunições do futuro... Tudo era banhado de negro ausente. Tudo era lavado, pela primeira vez, no rio da vida. Tombei. E levaram-me os corvos para terras sem nome, apagando-se, dilacerando-se a si mesmos como uma praga. Abandonando-me.
Perdido, em pura secura e amargura, apaguei-me também. Pois toda a água da vida servia uma só senhora: a Sede.
Então tudo voltou num só momento, a experiência, dentro de si mesma, a explodir o Universo.
A dança desvaneceu-se, eu era agora o rio... as pedras, as nuvens, nenhum... mas a vida que em tudo abunda.
Naquele dia o todo-maldito foi de mim retirado, para caminhar na minha sombra qual espirito familiar; e a morte disse: "Deixai os mortos enterrarem os seus mortos; deixai os vivos beberem com os vivos"
Na verdade,
só aqui me perdi.
Na verdade
só aqui, me ganhei...

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