Sunday, November 26, 2006

Só! – Não o é quem na dor, quem nos cansaços,

Tem um laço que o prende a este fadário,

Uma crença, um desejo… e inda um cuidado…

Mas cruzar, com desdém, inertes braços,

Mas passar, entre turbas, solitário,

Isto é ser só, é ser abandonado.

Como despreza o público suficientemente para o não temer já, para não condescender com suas vulgares exigências, por isso entra com passo seguro por caminhos novos e, fora já de sendas trilhadas, (o poeta) penetra na floresta rumorosa das ideias livres, dos livres sentimentos, vai e vem, senhor das extensões que descobriu e de que é rei, rei desses grandes “desertos” cheios de vida, como nunca entre os muros dos “povoados” aonde a morte moral estende o silêncio terrível das almas e das fantasias.

A política nunca foi muito para poetas, hoje e entre nós menos do que nunca. Creio que fez muito bem em abandonar esse campo lamacento (…). Portugal é um país eunuco, que só vive duma vida inferior, para a vileza dos interesses materiais e para a intriga cobarde (…). Deixemos pois passar a onda providencial e tratemos simplesmente, como indivíduos, de conservar cada um em si um foco tão intenso quanto possível de força moral, de inteligência calma e sofredora caridade, pois, no naufrágio desta sociedade, na perversão do espírito público, toda a esperança de regeneração está posta nas virtudes individuais. Se, no meio do geral envilecimento, a natureza humana se manifestar grande e amável em alguns poucos indivíduos excepcionais, ao mesmo tempo como protesto e como exemplo, não se poderá então dizer que está tudo perdido.

Sim, monge!, triste e só – porque o devora

A vaga nostalgia do deserto;

E vela a noite, e vai sempre desperto

A olhar de que banda venha a aurora.

Por céu, por mar e terra procuramos

O Espírito que enche a solidão

E só a própria voz na imensidão

Fatigada nos volve…

Mas num deserto só, árido e fundo

Ecoam nossas vozes, que o Destino

Paira mudo e impassível sobre o mundo.

Porque morreu sem eco o eco de teus passos

E de tua palavra (ó Verbo) o som fremente?

(…)

Agora, como então, na mesma terra erma,

A mesma humanidade, é sempre a mesma enferma,

Sob o mesmo ermo céu…

(…) quando apagas

Teu facho, ó sol… ficamos todos sós…

É nesta solidão que me consumo.

Antero de Quental

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